15.5.11

2. COMO TUDO COMEÇOU

Amauri Mauricio de Lima Por Luiz Carlos Chaves

Segundo um registro do FAA (Federal Aviation Administration), nos Estados Unidos da América, consta que a necessidade de Controle de Tráfego Aéreo surgiu no ano de 1930, justo quando a indústria aeronáutica começava a prosperar com a fabricação de aeronaves mais rápidas e de maior porte. O Transporte aéreo também começava a ser mais aceito pelo público em geral, seguindo as pessoas que tinham pressa em se locomover, e pela necessidade de executarem transações comerciais. Um grande número de cidades começou a construir seus aeroportos e, junto com eles, um espaço para a implantação de sala de rádio-comunicação, que recebeu o nome de “Centro de Controle”.
Pilotos foram treinados e preparados para vôo IFR, mais conhecidos como vôo cego, a fim de operarem entre as cidades de Cleveland, Ohio, Chicago, Ilinois, Newark e New Jersey. Eles transmitiam mensagens de suas posições e estimativas de chegadas nos aeródromos de destino. Este procedimento foi, inicialmente, explorado e executado pelas empresas aéreas com a finalidade de bem informar aos seus usuários.
Nos anos de 1936, o governo americano, com o demasiado aumento do fluxo de tráfego aéreo, decidiu assumir a responsabilidade desses centros e formou a primeira turma de oito controladores de tráfego aéreo.
No Brasil, por questões táticas, só na época da segunda grande guerra mundial, quando os norte americanos instalaram uma base aérea em Natal (RN), foi que o nosso país começou a perceber a necessidade de também implantar o Serviço de Proteção ao Vôo, estruturado em comunicação entre controladores e pilotos. Foi então improvisada à primeira torre de controle, no Campo dos Afonsos, que consistia na verdade, em uma mesa onde se colocou um rádio transmissor e um receptor 4495 de freqüência variada e um altímetro de avião. Havia também uma biruta a mais ou menos cem metros cem metros de distância da mesa, que fornecia a direção do vento, cuja velocidade era calculada por estimativa, conforme o ângulo que ela formava em relação ao mastro. Em pouco tempo foi construída uma torre de madeira.
Simultaneamente foi construída a torre do Rio de Janeiro, em cima do hangar ao lado do atual prédio do Aeroporto Santos Dumont. Os primeiros controladores foram: Idio, Coriolano, Ernani, Gauss e Silva. Eles começaram a trabalhar no principio dos anos de 1940, mas o controle de vôo no nosso país surgiu por volta de 1939, sob a responsabilidade do Ministério da Viação e Obras Públicas, portanto antes da criação do Ministério da Aeronáutica. Os pioneiros da proteção ao vôo foram alguns funcionários daquele ministério, outros da Panair do Brasil formados nos Estados Unidos, sendo que estes fundaram o PANOP-RIO, primeiro órgão de controle de tráfego aéreo nacional.
Finda a guerra, o Brasil, como as demais nações, entrou em acelerado ritmo de crescimento; já sob a égide do recém criado Ministério da Aeronáutica, construiu vários aeroportos por todo o nosso imenso território.
Junto com essa expansão vinha à necessidade de providenciar técnicos especializados para o atendimento do serviço, e ampliação do quadro de operadores a proteção ao vôo. Estes eram formados pela extinta Escola de Técnicos da Aviação, em São Paulo, e pela escola de Especialistas de Aeronáutica, no Rio de Janeiro, nas antigas instalações do velho Galeão, depois transferida para a cidade de Guaratinguetá (SP). Havia então os CTA´s civis antigos e os militares formados por ambas as escolas. Entretanto, não só o crescimento aeronáutico eram muito maior do que a Escola de Especialistas podia formar como, também, grande era a evasão dos controladores, por motivos vários, entre os quais salários baixos para tamanha responsabilidade. Daí premida pela necessidade de poder continuar atendendo a demanda do serviço, uma nova modalidade de adquirir, foi inovada: a contratação através de concurso, de civis que, uma vez aprovados, ficariam como militares. Foram os chamados Voluntários Especiais, formados pela extinta Diretoria de Rotas Aéreas.
Pequenos atritos eram inevitáveis entre estes e o pessoal da Escola de Especialistas, mas tudo superado pelo ideal comum: Prover segurança aérea a todo e qualquer custo. Abasteceu-se assim até 1961, quando voltou à prática anterior, ou seja, continuar arregimentando o pessoal através da Escola de Especialistas, exclusivamente.
Aqui vale a pena fazer uma reflexão bastante interessante: uma escola que, por semestre, recebia aproximadamente 500 alunos, conseguia formar nas suas diversas áreas, uma variante de 12 a 18 militares como controladores de tráfego aéreo, devido a especialíssimas qualidades exigidas para o desempenho desta função e, de repente, como num “passe de mágica”, ou súbita elevação de QI, entre duas turmas dos mesmos 500 admitidos, o percentual de controladores formados passou a atingir um elevadíssimo número.
Apesar desta injeção numérica, a previsão de lotação não satisfazia a necessidade do sistema e, mais uma vez foi aberto concurso aos civis, formando em 1974, no Instituto de Proteção ao Vôo (IPV) em São José dos Campos, a primeira turma de Dacta (Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo) civis, sob o regime CLT, portanto outro tipo de legislação. Dos civis formados, até hoje, nenhum deles foi destinado à defesa aérea. Neste meio tempo, aqueles pioneiros que continuavam mal pagos e que se cognominavam “Os Pioneiros”, galhardamente conseguiam atingir a faixa de tempo de serviço para a aposentadoria, e o fizeram, sendo gradativamente seguidos pelos militares mais antigos. Novamente o sistema se esvaziava e a prática agora adotada é a formação de controladores militares pela Especialista da Aeronáutica, pelo IPV com os voluntários Especiais (VTE) e civis da TASA.
A Torre de Controle era de Madeira, construída em 1941 para atender as necessidades da guerra e dar assistência aos aviões dos americanos que necessitavam pousar no Rio de Janeiro, diziam os antigos. Ela foi muito importante no período da II Guerra Mundial. Nessa época dos anos 40 havia também os famosos Balões de Passageiros que sobrevoavam o RJ e outros estados. Nos anos seguintes muita coisa foi assimilada e adaptada a nossa realidade, mas o pessoal da proteção ao vôo estava sempre atento para prestar toda assistência possível, para que o desfecho fosse coroado de êxito. Para tal lançava-se mão de tudo o que fosse imaginável e realizável dentre os equipamentos que se encontravam disponíveis para uma ação de ajuda técnica e salvamento.
No principio da década de 70, foi instalado no Galeão um equipamento radar que deveria substituir um outro que já havia sido desativado, porém não se sabe exatamente porque esse equipamento, conhecido como ASR5, jamais entrou em operação a pleno, apesar de apresentar uma boa imagem dos retornos dos alvos, tais como aeronaves, morros e formações meteorológicas, bem como excelente precisão nas informações de distância e azimute em relação à antena radar. Ele ficava ligado, mas não podia ser usado na operação. Mas nas situações graves fazíamos uso dele, mesmo sabendo que podíamos ser punidos, se soubessem que o utilizamos para essa finalidade.
De tanto o usarmos para “paquera”, ou melhor, procurando tirar proveito daquela facilidade que ficava a mercê dos nossos olhos, um chefe daquela época mandou retirar os controles de vídeo. Então somente o controle convencional era feito, ou seja, as autorizações emanadas do controlador eram baseadas nas informações que os pilotos lhes forneciam.
Bom... era uma manhã de chuva fina, teto baixo e visibilidade precária, e uma aeronave Bombardeio B26 decolou da Base Aérea de Cumbica, em São Paulo, para um vôo de instrução, com sobrevôo do RJ, e regressaria para Cumbica.
Depois de algum tempo de vôo no rumo do RJ, não conseguia mais se localizar, isto é, não tinha como precisar a sua posição, acreditando apenas que, pelo tempo estimado de vôo, já deveria estar sobrevoando a terminal RJ. Em contato rádio com o Controle, informou que estava com pane total dos instrumentos de navegação, mantendo oito mil pés e no topo da camada (expressão usada para se definir um vôo realizado acima das nuvens onde o espaço aéreo se apresentava claro e limpo). Quando uma mensagem deste tipo é recebida, todas as atenções se voltam para o operador que a recebe, mesmo que os demais estejam envolvidos em alguma outra tarefa.
Naquela época, não se trabalhava com fones e sim com receptores providos com alto-falantes, por isso era possível se ouvir as mensagens nos demais setores da sala de controle. O Controlador (o Moreira) interrogou o FAB se ele realmente não tinha nenhuma marcação de algum auxílio rádio à navegação. O Piloto respondeu que aparentemente estava no bloqueio (girando em círculos) de uma estação de rádio Broadcasting (Rádio-difusora), mas não podia identificá-la porque ela não informava seu nome. Havia uma outra aeronave, em contato na mesma freqüência, sobre Barra do Pirai, que se preparava para iniciar o procedimento de aproximação para pouso no aeroporto do Galeão e perguntou ao Controle Rio se poderia tentar localizar e interceptar o B26, para escoltá-lo até o rumo da pista. Essa aeronave era um jato Convair 990 da Varig.
O pedido foi imediatamente autorizado, até porque, aquela seria a única solução, já que o radar, conforme relato anterior tinha sido retirado da sala radar e não possuíamos RECALADA (Instrumento de terra que auxilia o controlador a localizar a posição de uma aeronave e trazê-la até a sua estação, através da portadora da radiofreqüência utilizada). O comandante da Varig, já em contato direto com o B26 da FAB, pediu para que este informasse qual era a freqüência em que ele, o B26, estava recebendo a difusora.
De posse da mesma, o Varig a sintonizou e informou ao avião da FAB que iria colocá-la no sistema de comunicação para que ele identificasse se era a mesma música que o B26 estava ouvindo. Enquanto isso acontecia, o controlador remanejou as demais aeronaves para outra freqüência de operação, deixando aquela disponível para uso exclusivo ao atendimento daquela emergência.
Uma vez confirmada que era a mesma estação, eles ficaram aguardando o término da música para verificar se o locutor iria transmitir o nome dela. Segundos depois, o B26, informou que avistara momentaneamente uma pequena cidade, mas não houve tempo para identificá-la. Por obra do acaso, uma pequena aeronave que procedia de Vitória para o Rio de Janeiro informou que havia avistado o B26, em atitude de curva sobre a cidade de Rio Bonito, no Rio de Janeiro, e que o mesmo poderia descer em espiral e pousar num pequeno aeródromo que ali existe. Entretanto este preferiu se manter naquele ponto até que o Varig se aproximasse, talvez por duvidar da resistência do piso em relação ao peso da sua aeronave. O piloto comercial pediu que ele se mantivesse no topo e continuasse na espera em círculos, naquela posição, até que ele ali chegasse e pudesse localizá-lo.
Tão logo se avistaram, o comandante do comercial deu-lhe a seguinte instrução:
- Agora vou tomar a proa de Caxias (rádio-auxilioà navegação e básico para pouso no Galeão) e você vai me seguindo. Vou reduzir ao máximo possível a minha velocidade para que você possa me acompanhar.
A medida que isso ia acontecendo, o controle tomava outras medidas tais como: deixar a rota livre a partir de 8000 pés para baixo, controlar o consumo de combustível de ambas as aeronaves, acionar o SAR (sigla internacional do serviço de busca e salvamento), assim como informar a Torre de Controle para liberar a pista e colocar a postos todo equipamento de emergência do aeroporto. Mesmo com a velocidade reduzida, o jato era obrigado a fazer continuas curvas de 360 graus por cima do B26 para que ele pudesse acompanhá-lo e mantê-lo a vista. Quando finalmente chegaram ao bloqueio de Caxias, o teto já estava mais alto, aproximadamente 300 pés e o topo a 6000 pés (1800 metros), e houve a seguinte mensagem do Varig para o B26:
- Nós já estamos sobre Caxias, agora vou fazer um afastamento para o lado de Nova Iguaçu e farei uma curva de reversão para a direita e vou te colocar no rumo da pista. Quando tivermos alinhados você começa a descida, usando uma razão compatível para chegar a final a 150 metros e prosseguir para o pouso. O teto está a 300 metros.
- OK Varig; Vamos lá! Respondeu o piloto.
Um dos componentes que se desenvolve num Controlador de Tráfego Aéreo é uma espécie de sexto sentido, e o Moreira, que até aquele momento era o operador que ocupava a posição de fonia efetuando o controle e a segurança das aeronaves, presentiu que aquele tráfego militar iria necessitar de muito mais apoio, além daquele que oficialmente tínhamos disponível. Solicitou então ao Loureiro e ao Messias que assumissem a sua posição para que ele pudesse ir ao andar inferior, na sala de manutenção, a fim de que, através da única tela de radar que estava em funcionamento, mas não homologada, ele pudesse identificar e localizar o B26, com o intuito de, se necessário fosse, assumir a navegação da aeronave e trazê-la em segurança para o pouso, pois todas as telas foram retiradas da sala de controle.
Porém, como desta sala, ele não dispusesse de equipamento rádio para trocar mensagens diretamente com a aeronave, utilizou-se de um intercomunicador que havia entre as duas salas e, por meio dele, o Moreira podia ouvir o piloto e “passar” ao Loureiro as informações necessárias a sua segura orientação.
Enquanto isso acontecia, o jato comercial, seguido do B26, informou que estava no alinhamento da pista e instruiu que ele iniciasse a descida, abandonando aquela trajetória para o B26 a seguisse e mergulhando nas nuvens acabasse por atravessá-las, saindo a 600 metros, em condição de vôo visual. Ficamos ali, diante da tela, acompanhando o Blip representativo do B26 mantendo a trajetória e aproximação. Após percorrer 3 milhas, ouvimos pelo intercomunicador, o Loureiro perguntar qual era a altitude dele, que ele estava cruzando para, assim, poder avaliar se a distância dele para a pista seria suficiente para executar a descida. Ouvimos a aeronave informar que estava a 5000 pés ( 1500 metros) e o loureiro voltou a insistir:
- Prossiga a descida para 1500 pés, você vai furar a camada e sairá no curso correto da pista.
Repentinamente, observamos que o B26 começou a abandonar o rumo da pista, com curva a direita e, a seguir, informou que estava subindo para o topo e prosseguindo para o rumo do mar. A partir desta atitude, presumimos que a tripulação tencionava abandonar a aeronave quando estivesse sobre o mar. O supervisor da equipe (o Loureiro) determinado pela vontade de salvar aquelas vidas, decidiu que deveria usar a tela radar, assumindo toda responsabilidade de futuras conseqüências e para tal acionou a equipe técnica para ligar no controle as telas que haviam sido desligadas.
O jato comercial decidiu pousar por estar com pouco combustível e, a partir daí, a terminal RJ ficou interditada para que pudéssemos dar toda cobertura ao Fab, Neste mesmo dia estava prevista uma operação de manobras militares, em conjunto com a Marinha de Guerra – Operação UNITAS -, e que um C130 (Hércules) engajado nesta missão e que estava estacionado na área militar do aeroporto. Através do coordenador SAR, foi tentado o auxílio do C130 para interceptação e escolta do B26, porém nada se conseguiu, e os motivos dessa negativa não nos foram revelados. Até esse momento, já haviam se passado 50 minutos e ao B26 restavam apenas 40 minutos de combustível. O Blip da aeronave continuava se deslocando para o mar, nas proximidades de Marica.
Nosso técnico em eletrônica, percebendo a agonia por que passávamos procurava acelerar o seu trabalho até que, depois de muita pesquisa conseguiu acionar uma das 3 telas de que dispúnhamos na sala de controle, e após uma avaliação, concluiu que ela oferecia condições suficientes para o atendimento daquele serviço e consultado pelo Loureiro se tudo estava bem, com os olhos fixos na tela, respondeu que com o clássico gesto do polegar para cima, tudo OK. Voltando a assumir a fonia, informou ao piloto que tinha condições de orientá-lo pelo radar e o piloto aceitou, iniciando o seu regresso para a linha da costa, em direção ao Galeão. Neste ínterim , levados pelo conhecimento do fato, começaram a chegar a sala, alguns oficiais aviadores, que queriam saber do B26. Entre eles estava um coronel que era o chefe da esquadrilha que fazia parte da operação UNITAS, que se sentou ao lado do Moreira, para acompanhar o seu trabalho.
Na sua trajetória de regresso para o Galeão, já sob orientação do radar, o piloto confirmava a posição e as distancias de alguns obstáculos terrestres, que o operador informava, por sabê-los visíveis acima da camada, o que aumentava a nossa confiança no sucesso da operação. Foi, então, mais uma vez alinhada a aeronave com a pista, a uma distância compatível, para que, iniciando a descida naquele ponto, pudesse avistar a pista e pousar.
Entretanto, pela altitude informada, sabíamos que estava iniciando o seu mergulho dentro da camada de nuvens, observamos que ele voltava a perder a confiança, pois começou novamente a executar uma curva enquanto informava que estava subindo para o topo. Restavam ainda uns 30 minutos de combustível para a aeronave, quando recebemos o chamado de uma aeronave C91 (Avro), pilotado pelo comandante da Base Aérea do Galeão, que havia decolado e nos pediu para orientá-lo na interceptação do B26 afim de comboiá-lo para o pouso, o que foi feito.
Foi repetida toda a operação anterior e mais uma vez vimos o B26, na aproximação final, abandonar o curso e subir tomando o curso do mar. Aquela atitude provocou uma visível irritação do oficial que estava, ao lado do Moreira, assistindo a operação.
- Você ainda tem condições de trazer esse cara até o pouso outra vez ? – Perguntou ele colocando as mãos sobre os ombros dele.
A pergunta foi feita com a conotação de saber se ele (o Moreira) ainda tinha condições psicológicas de continuar operando, diante das atitudes imprevisíveis do piloto. Era uma questão de risco porque o combustível da aeronave já era considerado no limite: se ele não pousasse dessa vez, poderia haver uma catástrofe. O Moreira deu um suspiro bem profundo, como se pensasse “Seja o que Deus quiser” e, olhando para o coronel, respondeu:
- Se ele cumprir as minhas instruções na integra, vai pousar!
Pedindo-lhe o microfone, o oficial depois de identificar-se, falou duro com o piloto: 


O controlador vai tentar trazer vocês para o pouso pela última vez, isto é uma ordem! Quero saber se vocês vão obedecer.

Alguns segundos se passaram e o piloto entendendo que estava presente um superior hierárquico seu, na fonia respondeu:

- Positivo! Estamos prontos!

E mais uma vez foi repetida a operação de trazer de volta o B26. Quando o Moreira comandou a curva para jogá-lo no rumo da pista, a 8 milhas da mesma, a aeronave já estava a 4000 pés e foi instruída a descer para 1500 pés (450 metros). O teto havia subido para 600 metros e seria bem menor o tempo que a aeronave voaria dentro das nuvens para “fura” a camada.

- Controle vou manter 4000 pés – falou o piloto.

O Moreira ficou pálido, enquanto o oficial se ruborizava e, pegando o microfone das mãos dele, falou enérgico, quase gritando:

- Obedeça as ordens! O que é que há com você?

- Positivo. Vo...vou descer – veio a resposta com voz trêmula de emoção.

E o Moreira, retomando o microfone e dominado a sua ansiedade continuou a transmitir.

- Cinco milhas para a cabeceira, altitude recomendada deve ser 1700 pés, informe quando atingir visual com a pista.

O “Blip” do avião veio se aproximando, 4, 3 e...

- Controle estou avistando a pista. Vou pousar! – falou o piloto com voz alegre e cheia de vida.

Enquanto efetuava o pouso e iniciava o táxi (rolagem) pela pista, o pessoal da Torre de Controle, que também acompanhava o desenvolvimento da ocorrência e providenciava o posicionamento das equipes de socorro na pista, informou-nos:

- Acabou a agonia.... Ele já está no solo.

A euforia foi geral na sala de controle. Todos se abraçavam por mais uma missão cumprida. O colega da torre voltou a contatar conosco informando que o B26 já havia abandonado a pista, entrando no pátio de estacionamento da Base Aérea e cortaria os motores. Havia somente 5 galões de combustível, o suficiente para voar 3 minutos apenas e todas as aberturas de abandono da aeronave estavam destravadas, o que caracterizava as pretensões da tripulação.

Soubemos mais tarde que o comandante da aeronave registrara, no seu diário de bordo, que as curvas comandadas pelo Controlador radar foram bruscas e haviam alterado a estrutura da aeronave de tal forma que o impedira de cumprir as instruções do controle. Evidenciava-se assim que ele estava procurando agir de uma maneira que o isentasse das suas responsabilidades.

Felizmente, o mesmo oficial que, junto a nós, havia acompanhado a operação, mandou que se procedesse a uma vistoria completa da aeronave, para apurar responsabilidades. Constatou-se que o que já era esperado: Não havia nenhum abalo na estrutura da aeronave e os instrumentos de navegação de bordo não tinham funcionado normalmente devido à colocação de uma pasta sobre o painel onde se encontravam instalados os ditos instrumentos. A ação nociva causada pela pasta foi motivada porque a capa da mesma possuía material ferroso e este agiu sobre as agulhas dos mostradores, que passaram a acusar direções incompatíveis com a realidade. Daí a partir deste fato, foi editado um alerta, pela DEPV, para o cuidado que os pilotos devem tomar em relação as instrumentos de bordo.

Quanto aos Controladores envolvidos na operação, foram indiciados num inquérito por terem se utilizado de um equipamento que não fora homologado. O chefe administrativo da proteção ao vôo do Galeão, não aceitava os argumentos dos controladores que tentaram fazer ver ao mesmo que se tratava de um caso de emergência, que vidas corriam perigo e ainda as conseqüências funestas que certamente ocorreriam caso não se lançasse mão daquela facilidade. Ainda, mais uma vez, a interferência do mesmo oficial, que ombreava conosco durante o acontecido, evitou que maiores aborrecimentos viessem a desencadear sobre nós. Seu apoio foi valioso e lógico, como não poderia deixar de ser, uma vez que foi testemunha ocular de tudo o que foi feito com objetivo maior de zelar pelas vidas daqueles que utilizam o transporte aéreo; o resto pode ser considerado “ossos do oficio”....


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